O meu namoro com Portugal pode vir dos tempos em que o catedrático de Literatura do Instituto de Ferrol nos fijo ler e compreender as cantigas de amigo, em quanto a catedrática de História punha em dúvida a história oficial da Espanha: nem Galícia era só Galícia nem Portugal era de todo Portugal sem Galícia. Olhando o mapa da Península Ibérica aparecia umha irregularidade: a faixa ocidental estava incompleta.
Quando chegou a hora de me iniciar na profissóm, nas ofertas de práticas para alunos da Escola de Engenheiros de Telecomunicaçóm achei umha em Lisboa, na Plessey AEP, e mália falar, ler e escrever inglês, vendo os meus colegas a tentarem acadar posto nos EE.UU. ou na Gram Bretanha, decidim-me por Portugal. E alá andei no meu SEAT 600 entre Ferrol e Lisboa, passando por umhas terras que “cheiravam a Galícia” polo menos até Coimbra.
Lisboa ensinou-me muito, e nom somente electrónica. Percebim que era a cabeceira dum mundo enorme do que falavam os galegos emigrados á própia Lisboa e ao Brasil abraiante. Aginha comprendím que Portugal era umha naçóm compacta, do Minho ao Algarve, se bem “o Norte” semelhava a Galícia do Sul cumha pujante capital, o Porto. Amigos galegos e portugueses de Lisboa falarom-me da ucronia dum Portugal com capital á beira do Douro. De ter sido assí, ¿como seria a fala oficial do país?
Lisboa, Anadia, Compostela; Ernesto Guerra da Cal, Manuel Rodrigues Lapa, Ricardo Carvalho Calero; e, ao fondo, Ferrol. Ferrol me fecit, como dizia Gonzalo Torrente Ballester, parafraseando o England me fecit de Graham Greene. A minha formaçóm em Ciências levou-me de Ferrol a Lisboa, para me converter em casual aluno de três professores de Letras (dous deles, ferroláns). Guerra da Cal era o galego máis lusista do mundo, Lapa considerava-se o máis galego de todos os portugueses, Carvalho luitou com denodo para que o galego “demótico” (escrito á castelá) deixasse passo a um galego “universal”, grafado á portuguesa (e segundo as regras históricas, galaico-portuguesas, da língua matriz da Lusofonía).
Marcado pola sabedoria desses grandes homes, a profissóm seguiu-me levando á que me atrevo a chamar Galiza Portuguesa, principalmente a Braga e Porto. Durante muitos anos passei com paciência a ponte do Minho e os controles de policia e alfándega. Até que Portugal e a Espanha forom admitidos no clube dos países europeus. Daquela eu, como tantos habitantes de aquém e além Minho, respirei umha sensaçóm de liberdade, de facilidade, de amizade, que os nossos pais nom dariam nem sonhado.
Ora, ao mesmo tempo xurdia umha consciência de dificuldade: contra todo o que mandavam a Geografia e a História, a Língua e os Costumes, séculos de vivirmos de costas viradas faziam difícil viajar dumha paisage de tojo e granito a outra de granito e tojo: as estradas e os caminhos de ferro nom se correspondiam coas vontades de unióm.
Mais seguimos com essa vontade em quanto se avançava noutras formas de comunicaçóm. Coubo-me a sorte de trabalhar no desenrolo das redes da Rádio Galega e da Televisóm de Galícia, fum diretor técnico da CTRVG e percibím o efeito que produzia a extensóm das coberturas sobre a fronteira do sul. Os “galegos” da outra banda ouviam e viam os desta, descobriam a sua continuidade étnica já dentro da Espanha.
Todo foi boa predisposiçóm no eido dos negócios e das Ciências. Só falhamos no das Letras: sem nos faltar deveço de conhecermo-nos, nom se adiantava na comunhóm literária. Ao norte do Minho ganharom os inimigos da apertura á Lusofonia, arrecunchados na Academia, sometidos ao poder que Madrid exercia a través de quem mandava em Santiago.
Em quanto a Autoestrada do Atlántico se desenvolvia, entramos num tempo de relaçóns intensas entre centros tecnológicos. Á volta do século estabeleceu-se a RedIT, que ia de Ferrol ao Porto, juntando esses centros numha idea clara: a de partilharmos infraestruturas e equipamento em rede. Desde o CIS Galícia de Ferrol –cuja direçóm técnica me quadrou exercer– ao Inegi do Porto, passando polo IDITE Minho de Braga, tentamos desenvolver projetos de ajuda ás industrias em funçóm das capacidades de cada um deles.
Foi umha bela época, de ilusóm que começava a dar fruitos quando neste Finis Terrae se compreendeu a importância dos programas de Ciência e Tecnologia da Unióm Europea. Para formarmos consórcios com parceiros dum mínimo de três países europeus, mesmo tinhamos a vantage de que o Minho nos dividisse no mapa de cores da Geografia Política: gente bem levada de cada área de conhecemento logo se punha de acordo co vizinho de além do rio. Assí conseguiamos presença de dous países.
Com lembranças agradáveis desta camaradage transfronteiriça aceitei a obriga de ir procurar fondos a Bruxelas para o que daquela se chamava I+D+i. O diretor geral de Inovaçóm da Xunta de Galicia, Salustiano Mato (despois reitor da Universidade de Vigo), deu-me a oportunidade de formar a organizaçóm que chamamos OPIDi, com escritórios em Ferrol e na capital da UE.
Doadamente, logo me relacionei alá cos que sentiam a continuidade entre o Norte de todo –a Marinha Lucense– e o Sul que acaba no Mondego. Em Bruxelas fum atopar outro português que quiçais se sinta ainda máis galego có profesor Lapa: Joaquim Pinto da Silva, portuense, funcionário da Comissóm Europea, dono da Orfeu, Livraria Portuguesa e Galega. Esta livraria-sala de atos culturais foi para mim, durante máis dumha década, um punto de achegamento á terra na que me figem persoa.
Nos anos de vivir aos saltos entre Galícia e Flandres puidem entrar na concepçóm que europeus sabedores tenhem da Euro-regióm onde o Velho Continente se largou aos mares, a onde voltou a caravela co aviso de existirem as Índias Ocidentais. Cuidam que temos o privilégio de partilharmos muito, em Europa e polo mundo; de sabermos recuperar séculos de separaçóm forçosa.
Mais ainda fica outro dabondo por andar. Eu nom desisto de que nos conheçamos verdadeiramente em termos de Literatura; nem renuncio a poder, algúm dia, viajar de Ferrol ao Porto num trem tam rápido e tam cómodo coma o que hoje me leva entre a Corunha e Vigo…
Será teima de velho escritor que sempre lhe quijo bem a todo Portugal.