Há poucos días o Faro de Vigo cualificava como de viral a esquela por eles publicada do particular velatorio de uma profesora de inglés que invitava aos amigos “con vino y tortilla”. Sentindo que eu podia perder com aquele adianto meu dia de gloria por não ser o primeiro, pois igualmente tenho previsto no meu testamento que -além de doar os órgaos que ainda servam de algo, incinerarme e aventar minhas cinzas no rio Bibei (em Viana do Bolo)- se ordee um velorio laico na minha Quinta do Limoeiro com a adega aberta e pinchos para todos os asistentes mentras deveria soar a marcha do antigo reino de Galiza… lembrei ainda Groucho Marx quando dicia a uma senhora que se se empenhava em seguir cumprindo anos ia morrer antes e pensava que a finada tal vez se me tinha adiantado por esse empenho; logo resultou que havia comezado a cumprir antes que eu.
Depois pensei nos amigos mortos que na sua despedida tratamos de recolher a alegria e animo que nos haviam regalado em vida e que polo tanto tambem se me adiantaron…
E assim lembrei a despedida do meu muito querido amigo Antón Bértolo, o Boticas, bom amigo, magnífica pessoa, generoso, solidario, aberto, coerente, nacionalista de coração e de feitos, amante do vinho, sempre disposto a colaborar em contra das injustiças e a prol de uma Galiza soberana; loitador incansavel contra os abusos na construção da autoestrada Vigo-A Corunha, com actuações que incluso o levarom á cadea. Na minha vida reconhezo que houvo um antes e um depois da sua morte; o Boticas estava sempre listo a ir a qualquera lugar onde sempre atopava muitedume de amigos e arrastava a outros muitos. Sempre optimista, sempre ledo, sempre disposto; era conhezido a ambas beiras do Minho co seu centro en Salvaterra ou em Tortoreos, na sua casa ou na da sua mulher Maria Angeles, igualmente generosa e amiga, ainda que vivise em Pontevedra e tivese a botica em Vilaboa. Tinha-te em danza constantemente, para aquele homem aparentemente pausado, de falar calmo, a vida era pura fervenza. Morreu novo e deixounos, alomenos para mim, uma vida mais triste, menos apaixoante. Aqueles convivios, aquelas grande reuniões, aquele constante conspirar para ver como podiamos burlar os negros designios que para Galiza tivo o Franquismo, aquelas festas divertidas que podia organizar a conto de qualquera cousa ou de nenguma, pois tampouco precisava motivos. Pasou o tempo, tampouco tanto, e do meu amigo Antón Bértolo apenas se fala. Antón, que mentras eu não morra ele tampouco morrerá de todo porque vive no meu íntimo, no meu recordo. Aprendím a conhezer Galiza e o Minho com seus olhos. Vivim com ele momentos bons e maus, especialmente bons porque incluso quando estivo na prisão acusado de danos ás obras da Autoestrada e de separatista, sempre ao locutorio, para falar comigo, trazia o mais amplo dos sorrisos. Na cadea de A Coruña agardavam juiço um grupo de nacionalista como o proprio Antón, Marisa, Manolo de Remesar, o Tupa e algúm mais; eu ia todos os fins de semana a visitalos e levava sempre algumas garrafas de vinho que passava ao interior sob a consciente e divertida indiferencia de algúm funcionario; não mostrarom nemgum interese na oferta que lhes figem de levar alguma garrafinha de canha pois ao parecer ja tinham no interior e quando preguntei como o conseguiam quedei pampo porque era de elaboração artesanal do Boticas.
Antón Bértolo foi todo um persoagem no nacionalismo galego da segunda metade do século passado; foi um referente da luita que mantivemos tantos de nós contra o franquismo; seu amor a Galiza custou-lhe saude, dinheiro, sacrificios e incluso cárcere. Parece incrível que o nacionalismo ou os nacionalistas que com ele convivimos, que tantas vezes sentimos medo e alegrias juntos, que tantas vezes superamos temores apoiados no contacto recíproco, podamos deixar que transcorra o tempo sem recuperar sua figura, sua entrega.
Filhas e mulher organizarom um funeral á sua medida. Foi uma festa da palavra e do sentimento na sua adega, bebendo o vinho que ele comenzava a elaborar para plantarse no mercado com um albarinho (condado) de qualidade e brindando polo seu irrenunciável recordo. Um funeral laico mais emotivo que qualquera religioso porque alí ninguém dirigia os assistentes, senom que todos livremente manifestamos o noso mais profundo sentimento ou as anedotas mais divertidas com Antón. Pensei que nunca o esqueceriamos; não sou o único que não o esquecim, sinto que vive em mim mas tambem quando ainda atopo amigos de aquela época, sempre o referente é Antóm Boticas.
Outro que lembrei foi o amigo, ainda que por idade pudera ser meu filho, Luis Crego. Luis penso que foi a pessoa mais boa que conhezim na minha vida e tinha uma companheira igualmente boa. Luis foi empregado no meu escritorio, depois trabalhou na ONCE, de familia do Ribeiro que tambem eu sinto como minha. Era animoso, aventureiro, e irradiava simpatia. Seria superfluo acrescentar caracteres que adornasem a Luis pois englovava todos, era naturalmente bom. Tambem cómplice por uma Galiza soberana. Morreu novo, quando havia alcanzado uma estabilidade de vida e de futuro. Realmente o de Luis foi um roubo, nos roubaron aquele ser que te reconciliaba com uma humanidade cada vez mais egoista e insolidaria. Os irmaos e a companheira tiverom a feliz ideia de reunirnos aos amigos na Taberna de Lino (em Moaña) que Luis frequentava, e alí tivemos um acto lúdico, num precioso dia de sol no que músicos, escritores, rapsodas, cantantes, e todos amigos de Luis pudemos dicer nossos sentimentos, pudemos cantar, comer (algo mais que pinchos) e beber; tambem emocionarnos e incluso chorar. Assim despedimos a Luis desta dubidosa realidade, mas conservamolo no real e efectivo sentimento.
E olha como uma broma a conta de um funeral pouco comúm aflorou a coincidencia de outros dous funerais totalmente sentidos de dous amigos queridos, ambos recordados, mas que merecem um recordo mais compartido.