No dia 30 de abril de 1963 falecia em Ourense Vicente Risco, vai fazer este mês 57 anos. Nos últimos tempos a sua extraordinária figura é um pouco controvertida, generando bastante debate em artigos de imprensa, entre estudiosos e investigadores, pela sua atitude tomada após o golpe de estado fascista de julho do 36. Na maioria dos casos, os comentários não têm em conta o contexto vital de Risco, a sua formação e leituras, a sua poliédrica personalidade, as muitas etapas pelas que passou o seu pensamento e o ter sido um vulto importantíssimo para a cultura da Galiza, pois ademais devemos lembrar que este ano se cumpre o centenário do seu livro Teoria do nazonalismo galego, publicado em Ourense em 1920, e o da revista Nós, da que foi o seu diretor em todo o seu devir histórico de 1920 a 1936. É muito recomendável ler o opúsculo escrito por Jesús de Juana, sobre ele, que, junto com a monografia escrita por Carlos Casares, me parece um dos mais acertados estudos. E também a tese de doutoramento a ele dedicada pelo inspetor de ensino e meu ex-aluno José Fernández, que foi editada pela Deputação Provincial há pouco tempo.
Aproveitando o estar no mês de abril e às portas do mês de maio, o mais relacionado com as nossas letras, quero comentar o que Risco pensava sobre a língua da Galiza. Na revista Nós, números 6 e 7 do ano 1921, editada em Ourense, Vicente Risco publica um estupendo projeto, que intitula “Plano pedagógico para a galeguização das escolas”. Este plano, além de ser muito revelador de que Risco estava totalmente ao corrente das tendências educativas do momento e dos princípios da Escola Nova europeia, não tem um mínimo desperdício. Em outro momento publicarei um livro monográfico sobre o relacionamento de Risco com Tagore, pois ele foi no nosso país o verdadeiro descobridor do vate bengalí. Embora, esta vez quero comentar o que pensava sobre o nosso idioma. Destacando que durante bastante tempo assumia a escrita lusófona para a língua galega, tal como a que uso desde sempre eu nos meus artigos. Na sexta seção do projeto antes citado, sob a epígrafe de “O Galego na Escola”, entre outras cousas, Risco escreve: “O ideal seria que o ensino se desse em língua galega”. Esclarece que sobretudo para que o mestre seja compreendido, ali onde a língua materna dos rapazes for o galego, como é o caso do meio rural. Por isso assinala que não se pode deitar para fora das aulas o nosso idioma, e se o fizermos estamos a promover o auto-ódio e o desprezo pela nossa Terra, além de matar o nosso pensamento e a nossa literatura, e favorecer a nossa baixa autoestima secular.
Para Risco usar nas aulas o nosso idioma tem muitas vantagens pedagógicas. Entre elas destaca que desenvolve melhor a inteligência dos estudantes, favorecendo a compreensão dos conhecimentos. Empregando-o alternando com o castelhano, facilita a memória complicativa, favorece comparar ambos os idiomas para chegar a falá-los, e influi muito na formação de sentimentos positivos. Como são o de amar mais a Galiza e formar o caráter dum jeito especial, pela musicalidade, doçura e suavidade que tem a fala galega. Neste tema Risco está-se a adiantar em muitas décadas à ideia atual da importância que tem a inteligência emocional, e que é preciso desenvolver nos rapazes aprendizagens apreciativas. O que mais adiante escreve é muito significativo, mesmo para hoje: “Ninguém pode pôr em dúvida a grande vantagem de possuir dous idiomas, no lugar de só um. Não imos os galegos perder estupidamente esta vantagem, esquecendo a nossa língua materna. Pois as nossas duas línguas que temos são muito importantes: a castelhana é uma das que se falam por maior número de almas no mundo. Ela abre-nos todos os países de fala castelhana. A nossa, a galega, na sua forma portuguesa (galego e português são dous dialetos de uma mesma língua) é uma das mais estendidas pelo mundo, mais ainda que o castelhano. Ela abre-nos todos os países de fala portuguesa ou lusófona. Seríamos parvos se perdêssemos uma destas potentes armas de luta pela vida e de formação de cultura. O galego pode, com elas, abranger duas civilizações”. A seguir Risco, depois do que assevera, assinala que não se pode proibir que os rapazes se exprimam em galego, em todos os âmbitos e lugares e nas suas perguntas aos docentes. Que, usando o método comparativo, nas aulas os rapazes vejam as diferenças gramaticais e linguísticas entre ambos os idiomas. Que se lhe outorgue importância à leitura de poemas, contos e relatos, bem escolheitos, da nossa língua, de forma graduada. Que as leituras sejam bem comentadas e explicadas e a literatura galega, e as suas figuras mais importantes, sejam estudadas convenientemente e com estratégias adequadas. Que também, em especial os estudantes melhores, elaborem poemas, inventem e redijam contos e relatos em galego. E, por suposto, dado que este ano, por fim, se lhe dedicam as Letras Galegas a Carvalho Calero, temos que desenvolver em todos os centros de ensino galegos dos diferentes níveis, um amplo programa de atividades variadas em torno à sua grande figura.
No ponto sete do projeto acima citado, Risco escreve sobre o ensino das cousas da Terra: a geografia e história da Galiza, a vida de galegos e galegas ilustres, a arte galega, a literatura galega e as ciências e disciplinas práticas: agricultura, indústrias, labores e trabalhos manuais. Com aplicação à Nossa Terra. Mas, deste tema teremos que escrever outro dia. Fica, de momento, dito o anterior, depois de se terem publicado tantos e absurdos decretos nefastos para o nosso idioma na Nossa Terra. Que Risco nunca aceitaria.